Caso Metanol: se não se mexer, marcas de destilados podem sofrer baque irreversível

Agora não há mais dúvida de que o caso metanol irá representar um antes e depois para a grande indústria de destilados. Sim, bebidas batizadas sempre existiram, mas até poucos dias atrás, no imaginário popular, o risco era de uma ressaca braba garantida no dia seguinte.

O consumidor se deu conta do risco de perder a visão — ou até a vida — por uma noitada. Seja sincero, você se arriscaria a beber um uiscão 8 anos numa festa de casamento neste fim de semana?

Mais do que nunca, as duas mais celebradas companhias do setor — Diageo (Johnnie Walker, Smirnoff e Tanqueray, entre outras) e Pernod Ricard (Absolut, Ballantine’s, Chivas, Beefeater etc) — deveriam unir forças com outras empresas do segmento para adotar medidas realmente convincentes para aumentar a segurança do consumidor. É sério: estas marcas famosas podem sofrer um baque irreversível no país.

Chega, por enquanto, de pensar em contrato de exclusividade com bares, restaurantes e casas de shows, dar tapinha nas costas dos bartenders e fazer eventos grandiosos. A lógica é simples: são estas marcas famosas as mais visadas pelos criminosos. É impossível para o cliente do bar, convenhamos, verificar lacre, rótulo, tampa e número de registro.

Um exemplo veio da Mistral. Diante do grande volume de vinhos trazidos ilegalmente para o Brasil, a importadora criou um selo de segurança em parceria com a Catena Zapata — uma da vinícolas que mais sofre com a proliferação do contrabando e das falsificações. 

Outra medida poderia premiar de alguma forma a devolução das garrafas vazias, encontradas facilmente na internet e base de toda essa cadeia de falsificação.

Um segundo aspecto dessa história diz respeito à inflação etílica dos últimos anos. Não faz tanto tempo assim que os melhores bares de coquetelaria de São Paulo vendiam drinques na faixa dos 30 reais. De repente, esses valores foram subindo ao céu. Hoje, em qualquer endereço mais bacana da cidade, um drinque bate fácil nos 50 reais.

Coquetéis passaram a custar, em alguns casos, mais do que pratos do cardápio. Não havia saída para a imensa maioria dos estabelecimentos senão repassar o aumento das bebidas nos coquetéis.

Quem tentou burlar esta lógica de mercado — seja por ganância ou irresponsabilidade — optou por arriscar a vida dos próprios clientes e cometer o crime de adquirir bebidas sem qualquer lastro. A tragédia estava consumada.

A lição é clara: se a conta parece boa demais para ser verdade, provavelmente não é. Melhor brindar com menos frequência — mas com segurança — do que transformar um happy hour em pesadelo.

Jornalista paulistano, foi crítico de bares da revista Veja São Paulo durante dez anos (2003 a 2013) — período em que escreveu e foi jurado das edições anuais Comer e Beber. Antes, trabalhou como colunista do Estadão (de 1994 a 2001) e colaborou para o Jornal da Tarde e revista Época São Paulo. Em 2014, criou o Taste and Fly, onde publica semanalmente posts sobre os melhores bares e restaurantes de São Paulo além de dicas de viagem e bebidas.

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